Campeonato Nacional de Yole 2023
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Regatas e Campeonatos
A discussão "remo de lazer versus remo de competição" é um tema recorrente nos três clubes. O primeiro trás pessoas aos clubes que contribuem para a sua manutenção, mas não lhes dão títulos. O remo de competição trás jovens aos clubes, mas também grandes encargos. O equilibrio entre as duas modalidades, apesar de serem complementares, nem sempre é fácil de gerir. Os barcos são também diferentes. No remo de lazer, privilegia-se a sua estabilidade, os yoles podem ser usados em águas agitadas. Nos barcos na competição a prioridade é a velocidade daí serem muito esguios, destinam-se a ser usados em águas calmas e obedecem a rigorosos padrões internacionais.
A primeira "regata" em que participamos foi a 14 de Dezembro de 2019, na regata comemorativa do 91º. aniversário do Clube Ferroviário de Portugal. O dia era de festa, como não podia deixar de ser. Da competição que também houve, pouco retivemos. O que nos ficou na memória foi o convívio que juntou antigos e novos atletas, e o desfiar de memórias de "feitos" havidos e a convicção num futuro promissor repleto de jovens remadores.
Na segunda regata - a Regata Inter-Sócios / Magusto -, a 12 de Novembro de 2022, a ANL teve o cuidado de numa mesma embarcação juntar várias gerações de remadores. Foram comigo, dois rapazes e uma rapariga, cujas idades não ultrapassariam os treze anos. Ficamos em segundo !
A terceira regata - IX Trofeu Open Ferroviário, no dia 13 de Maio de 2023, na pista da Junqueira, decorreu de um convite do Clube dos Ferroviários de Portugal à Associação Naval de Lisboa - Remo para participar neste evento. Estiveram presentes 10 clubes, 80 embarcações, 329 atletas, totalizando 14 regatas. Neste dia foram inaugurados dos dois novos barcos com o nome de dois treinadores nossos conhecidos: António Arnega e Cruzinha.
No pontão foi grande a agitação de barcos que chegavam das regatas ou partiam para a linha de partida na pista da Junqueira.
Carlos Henrique dirigia as operações no pontão, apoiado por António Arnega, treinadores do Clube Ferroviário de Portugal.
O grupo do lazer da ANL, orientado por Filipe Nuno Monteiro, era constituida por quatro equipas - três de remadoras e uma remadores. A regata foi desde o inicio assumida como uma festa colectiva, sem intuitos competitivos. Ao certo ninguém sabia bem o que nos esperava, nem se para além dos Ferroviários haveriam outros clubes participantes. Por volta das 9h00 da manhã na Doca de Santo Amaro, a hora a que chegamos, a agitação era enorme de atletas e das suas embarcações.
Os vinte participantes na regata do grupo de lazer treinado por Filipe Nuno Monteiro, reuniram-se para lhe enviarem uma mensagem de uma rápida recuperação. Está temporariamente ausente.
Foi com alguma surpresa que vimos chegar dois barcos do Clube Naval de Lisboa, cuja tripulação era maioritariamente constituida por estrangeiros. Após dois dedos de conversa com o Paulo, treinador do CNL, fomos vendo chegar atletas do Artejo- Associação de Remadores do Tejo (Moita), Clube Naval Setubalense, Nova Rowing Club (FE-UNL, Oeiras), G.D. Ferrroviário do Barreiro, Clube Naval Barreirense entre outros. Estavamos numa Regata ! No pontão, Carlos Henriques, treinador nos Ferroviários, comandava com voz firme as operações de embarques e desembarques.
As duas embarcações do Clube Naval de Lisboa, um yole de 4 e outro de 8, foram dos primeiros a chegar.
A partida dos barcos para a linha de partida era seguida atentamente, suscitando comentários sobre as capacidades técnicas mostradas pelas diferentes equipas.
O dia estava especialmente convidativo para uma pausa relaxante, assistindo a um belo espectáculo nautico.
Madalena Ferreira, uma dedicadissima treinadora do Remo Adaptado não deixou de estar presente com os seus atletas. Obrigado Madalena pelo teu exemplo.
O ambiente festivo da regata, agradou ao nosso grupo. Tiramos uma quantas fotografias para recordação e cada equipa começou a pensar como iria enfrentar o inesperado desafio. O timoneiro da minha equipa - Filipe Santos -, experiente nestas andanças indicou a forma como deviamos "atacar". As primeiras cinco remadas, embora curtas eram essenciais para vencer a inércia do barco. A partir daí as remadas seriam compridas e rápidas. Iriamos procurar navegar junto ao paredão, pois a corrente seria aí menos agitada. A nossa manga era constituida por sete embarcações (yoles de 4). Estavamos numa competição e ninguém queria ficar mal na fotografia.
A chegada de uma equipa é sempre recebida com palmas independente do clube.
A nossa equipa !
Em manobras a caminho da linha de partida. O alinhamento dos sete barcos barcos na nossa manga, colocou à prova a experiência do timoneiro. Tinhamos como objectivo colocarmo-nos junto ao paredão, mas outro barco da ANL já se havia antecipado. A prova era de 1000 metros e até metade ainda acreditamos nas medalhas. Depois, caro leitor, faltou-nos ar nos pulmões e acabamos em quarto.
A regata mais aguardada, umas das últimas a ser disputada, era das equipas femininas de Lazer do ANL. Os resultados foram excelentes. Após a regata, as quatro equipas da ANL uniram-se no Tejo para entrarem em grande estilo na Doca de Santo Amaro.
A chegada ao pontão da Doca de Santo Amaro dos 4 barcos da ANL, com tripulações femininas, sob o olhar atento de Paulo, treinador do Clube Naval de Lisboa. Conquistaram na sua categoria o segundo, terceiro e quatro lugar.
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Uma das efusivas equipas de Lazer da ANL, pouco antes de receberem as merecidas medalhas das mãos de António Arnega. |
A Merecida Vitória
O dia 11 de Novembro de 2023 ficará para a história destes apontamentos do remo em Portugal. No torneio entre os sócios da ANL-Remo, a equipa de yole 8 (Lisboa) que vemos junto ao pontão, ficou em primeiro lugar na banda a que concorreu. Esta gloriosa equipa era constituida pelos seguintes elementos: Jaime Netto, Rafael Sanchez, Miguel Inácio, Inês Vicente, João Pinto, Carlos Fontes, Teresa Calder e Sunayana. Foi um prova renhida. A três quartos do percurso, o timoneiro gritava eufórico: "Estamos em primeiro, força, força". Á voga estava uma jovem atleta do ANL, logo seguida à sota do director do Jornal da Praceta. A cadência mantinha-se elevada, a respiração ofegante, à beira da exaustão. No momento que era evidente o cronista estava a "estoirar" ouviu-se o apito da chegada. "Terminou, ganhamos!." A alegria estava bem reflectida nos rostos dos oito remadores e do timoneiro quando entramos na Doca de Santo Amaro, sob o aplauso dos que se deleitavam com as provas deste torneio. Não houve medalhas, mas um magosto. Era dia de S. Martinho.
Atletas
Qualquer livro sobre remo, repete invariavelmente as palavras de Pierre de Coubertin, fundador dos jogos olimpicos da era moderna, de que o remo é o desporto mais completo de todos. É um desporto que mexe com todo o corpo e predispõe a mente para elevar-se a um plano superior de concentração e abstração. No passado, a única exigência que se colocava à sua prática era saber nadar, hoje, com o "remo adaptado" nem sequer este requisito é obrigatório. No remo de competição as exigências são outras, nomeadamente sobre o repouso, a alimentação... Leopoldo Lehrfeld, durante muitos anos treinador da ANL antes de passar para o Ginásio Clube Português deixou-nos, em 1947, alguns conselhos sobre a alimentação dos atletas, em particular dos portugueses:
" Atendendo às condições em que o remador português pratica o remo desportivo, com o objectivo de ganhar competições, não recomendo que se imitem apenas as severas regras que são tradicionais em certos países. Pode o remador português continuar a beber um copito de vinho, às refeições, desde que não seja mais mais do que um; a comer o seu bacalhau com batatinhas, etc., sem necessidade de um regime alimentar especial. Deve porém evitar por completo o uso de bebidas alcoólicas fortes e de comidas desiadamente apimentadas ou indigestas. Reconhece-se já que em outros países que, por vezes, o rigor demasiado pode ser contraproducente, pelos transtornos que causaria na ordem caseira, um regime especial de alimentação; e, ainda porque é discutivel, se a modificação do regime habitual não iria causar mais prejuízos do que vantagens a um remador amador que, afinal, tem a sua vida profissional". Um a coisa era proibida: fumar desde o início dos treinos, visto que actua como um "veneno cardiaco", FPR, Anuário de 1947, "Conselhos de um Treinador", pp. 32-33.
Treinadores
Leopoldo Lehrfeld, em 1960, deixou-nos um retrato dos treinadores de remo em Portugal. Eram o "protótipo do carola". Apaixonados pelo seu clube e "fanáticos" pelo remo. A sua dedicação não tinha limites: "Modestos, de paciência inacreditável para aturar os principiantes, bondosos e enérgicos, não procuram receber outra compensação pelo seu trabalho, senão uma satisfação intima". A continuidade do remo entre nós devia-lhes quase tudo". O seu exemplo incutia nas equipas que orientavam uma tal força que as levava a vencerem outras muito melhores em termos físicos e de técnica. Faziam tudo no clubes: timoneiros, instrutores e treinadores. Saber ensinar, segundo Lehrfeld, era uma vocação, consolidada por uma longa experiência a remar e no conhecimento das suas técnicas, postas à prova nas demostrações que faziam perante o olhar de todos. Era isto que inspirava a confiança nos remadores e os galvanizava a superar as adversidades. Ser treinador era uma actividade amadora, embora reconhecidamente complexa (L.L., Considerações sobre a maneira de remar, sobre treinos e corridas, 1960). Os "carolas" nos nossos dias deram lugares aos profissionais dos treino de remo. A "vocação" aos diferentes "estilos" no treino.
Desde fins de 2018 já conhecemos vários treinadores cada um com o seu "estilo". É uma profissão bastante exigente, tendo em conta as competências técnicas e psicológicas exigidas para um bom desempenho. Em Portugal, a formação dos treinadores de remo de forma sistemática começou apenas em 1976, quando entraram também em actividade as escolas de remo da Direcção Geral dos Desportos. Um outro passo importante foi a constituição, em 1989 de um conselho de treinadores e em Setembro de 2004 surgiu a Associação Nacional dos Treinadores de Remo. Se as competências técnicas e cientificas são importantissimas num treinador, aquilo que observamos leva-nos a concluir que também são as competências de liderança, comunicacionais e relacionais em função dos diversos grupos etários e modalidades de remo. A nossa experiência subjectiva que dificilmente por ser generalizada.
O estilo de liderança dos treinadores que tivemos os privilégio de ter, não se afastam muito da tipologia tradicional dos estilos de liderança.
Na primeira experiência, o treinador centrou os objectivos no rendimento no ergometro. Sessão após sessão tinha em vista aumentar a performance na máquina. A comunicação e os estimulos estavam subordinados aos resultados obtidos no ergometro. O problema, como já referimos, é que o nosso objectivo era remar no Tejo e é não apenas aumentar o rendimento físico. Este desfazamento estes os objectivos do treinador e do treinado conduziu a uma crescente desmotivação e à mudança de clube. O sucesso ou insucesso de muitos atletas, como é sabido, decorrem muitas vezes destes desfasamentos ( Ana C. P. Rodrigues, O impacto da dificuldade dos objetivos no esforço de atletas de remo – o papel da empowering leadership dos treinadores, 2016 )
Na segunda experiência nos Ferroviários foi desde o inicio notória a preocupação do clube em conjugar vários objectivos: a melhoria na performance física e o prazer de remar no Tejo. Um objectivo que leva a maioria dos atletas em Lisboa a inscrever-se nos clubes de remo. O treino tanto podia ser feito no rio, tanques e no ergometro, em sessões alternadas ou combinadas. As equipas eram mistas (homens e mulheres), tendo todavia elementos com objectivos muito diversificados: uns davam prioridade ao "prazer de remar" outros ao " esforço colocado na remada". A palavra de cada treinador sobre as sua própria experiência no remo, ou histórias marcantes do clube, funcionava como um factor motivador para a continuidade da própria participação dos atletas. O Clube, com um série de iniciativas, dava corpo a este envolvimento estimulante.
A terceira experiência na Associação Naval de Lisboa foi excepcional a todos os níveis. Encontramos um grupo com uma forte coesão e "identidade" fruto da amizade existente entre vários remadores, cultivada ao longo de vários anos. Tem muitas histórias em comum para contar. As suas profissões são as mais diversas possiveis: professores, bancários, médicos, comerciais, enfermeiros, arquitectos, informáticos entre outras. A maioria são portugueses, mas também há brasileiros, espanhóis, ingleses, cuja permanencia no grupo é mais irregular. O objectivo comum é o lazer, aliado a uma preparação física q.b.. O teinador, com um estilo afável e positivo, é o elemento integrador e dinamizador do grupo, procurando constantemente conciliar os objectivos individuais com as exigências da prática do remo. Com uma comunicação aberta e permamente, recorre vários canais de comunicação como o "WatssApp". Valores como a cooperação e a partilha são cultivados de diversas formas, como na comemoração dos "aniversários da Semana". Apenas no dia 20 de maio de 2023 assistimos a uma quebra nesta tradição. Na Alameda da Universidade, uma multidão de estudantes com familias e amigos, participava na Benção das Fitas. A longa cerimónia obrigou ao corte de algumas vias de circulação na zona, formando-se nas restantes enormes congestionamentos no transito. Em Santo Amaro, o treino orientado por Martim Leitão (substituto) começou às 8h30 e terminou às 11h00. Telefonemas de uma lado para o outro, até que veio a notícia de Alvalade: O "bolo de aniversário" e tudo o que o acompanhava, por uma sucessão de coincidências que só o acaso explica, estava retido no meio do tráfego !. Havia que adiar a "festa". Chegou-se facilmente a um compromisso com o aniversariante: em 2024 haverá não um, mas dois "bolos" !. A ausência de um "bolo de aniversário" voltou a repetir-se no sábado seguinte, o que foi criticado. Alguns atribuiram estas falhas à ausência (temporária) do treinador, o que é revelador da sua importância para a coesão e dinâmica do grupo.
Pormenor da Benção da Fitas.20/05/2023
O registo fotográfico de cada treino, para além de permitir fixar e rever imagens de rara beleza que o remo proporciona, acaba por funcionar como um elemento agregrador do grupo, motivando a continuidade da prática e o próprio desejo de cada uma se superar em cada treino. Uma das preocupações centrais do treinador era evitar que o grupo se fechasse sobre si próprio, o que foi facilitado pela constante integração nas tripulações de remadores estrangeiros que passavam por Lisboa. |