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Destruição do Jardim da Rua José Lins do Rêgo para construção de um parque de estacionamento

Breve Cronologia de Factos

O caso da destruição deste jardim para a construção de um parque de estacionamento, prova a forma autista e no mínimo enigmática como a CML conduziu este processo, ignorando sistematicamente a opinião da maioria dos moradores.

Como Tudo Começou

1994

Tudo começou, em 1994, quando a CML, sob a direcção de Jorge Sampaio/João Soares, resolve promover a apropriação privada de jardins públicos. O pretexto era a simples: Tratava-se de dinamizar a construção de alegados parques para residentes em dezenas de bairros de Lisboa. 

 

O espaço público era cedido, por 99 anos a grupos privados (anónimos) para que estes puderem investir no negócio do estacionamento em Lisboa. 

 

Por toda a cidade, formam-se grupos de alegados residentes, os quais em conivência com dirigentes e funcionários camarários, através de processos fraudulentos acabam por se apropriar de dezenas de jardins públicos.

 

Publicação da Deliberação 500/CM/94 sobre parques de estacionamento residências por proposta do vereador do Pelouro do Transito e Infra-Estruturas Viárias, Machado Rodrigues

 1996

Era cada vez mais evidente, lendo a comunicação social,  que a câmara pretendia transformar os jardins de bairro em parques de estacionamento, libertando-se desta forma dos encargos com a sua manutenção.

O então vereador dos espaços verdes, Rui Godinho visita a praceta José Lins do Rego e promete acabar com as várias lixeiras no Bairro.

1997

Ano de eleições autárquicas.

Inicia-se o processo da publicitação dos denominados parques residenciais. Fica-se a saber que estão na mira alguns jardins emblemáticos de Lisboa, como o Príncipe Real.

Maio. Num documento do Pelouro do Transito assinala-se já a construção de um parque residencial na zona da Praceta. Ignora-se que estudos foram feitos para determinar este local como o mais apropriado, em toda a Freguesia, para a sua construção

 A Junta de Freguesia do Campo Grande promove, através de um edital afixado num pequeno café do bairro, a construção do parque na praceta.

21 de Maio. Um membro de uma comissão "ad hoc" de moradores, pelas 17h00 é recebido pelo presidente da Junta de Freguesia do Campo Grande. Este garante-lhe que é apenas um simples intermediário em todo o processo.

27 de Maio. Após a consulta do "dossier do parque", os moradores verificam que à frente da sua comissão promotora se encontram pessoas que não eram residentes na freguesia, alguns com uma péssima reputação no Bairro.

Na Assembleia da Junta de Freguesia, um morador, apresenta um documento detalhado sobre o assunto e são apresentadas alternativas para a localização do parque. É solicitado à mesa que o documento fique registado em Acta.

30 de Maio. É apresentada ao vereadores Rui Godinho (Espaços Verdes) e Machado Rodrigues (Transito) e aos Presidentes da Câmara de Lisboa (João Soares) e da Junta de Freguesia alternativas para a localização do parque. Não faltam espaços devolutos em toda a área.

 

É neste contexto que em 1997 surge uma associação promotora de um parque de estacionamento subterrâneo para o jardim da Rua José Lins do Rêgo. A Junta de Freguesia do Campo Grande apoia então activamente esta iniciativa, concedendo ao grupo de promotores do parque todo o tipo de apoios logísticos. 

 

Alarmados com a situação, logo em 1997, os moradores desenvolvem várias iniciativas contra a localização do parque. No ano seguinte,  cerca de 100 moradores num abaixo-assinado afirmam que: 

 

1º. A construção do parque significava o fim de mais um espaço verde, numa das zonas da cidade mais afectadas por poluição atmosférica e sonora. Situação agravada pela passagem ininterrupta de aviões;

 

 2º. O número de lugares de estacionamento previsto não resolvia os problemas da zona, antes os aumentava; 

 

. Estudos encomendados e publicados pela CML, recomendavam e apresentavam melhores opções para a resolução do problema do estacionamento no local;

 

4º.  Não tinham sido ponderadas outras alternativas; 

 

5º. Não haviam sido realizados estudos técnicos sobre os riscos que a construção do parque poderia representar para os edifícios envolventes e as alterações do níveis friáticos. 

 

6º. Os moradores não foram consultados como a lei expressamente o exigia;  

 

Apesar dos protestos dos moradores, a Junta de Freguesia coligada com novos membros da Associação promotora do parque, prosseguiu com o processo do seu licenciamento e na angariação de novos investidores privados. Tudo se passou no mais completo segredo. Nenhuma informação é prestada aos moradores pelos orgãos de informação autárquica.

 

Entretanto, a CML, com a conivência da Junta deixa de tratar do jardim e das ruas da zona. O lixo amontoa-se, a degradação do ambiente aumenta.

1998

 O jardim é abandonado. As plantas  não são renovadas e só muito esporadicamente  é limpo.Os serviços de manutenção e conservação de jardins da CML preparam desta forma as condições objectivas para a "aceitação" da construção de um parque na praceta. As árvores e plantas apesar de mal tratadas vão resistindo devido à grande humidade do subsolo.

 20 de Abril. Abaixo-assinado com mais de cem assinaturas, correspondentes outros tantos apartamentos, pronunciando-se contra a localização do parque e levantando inúmeras questões às quais os serviços municipais se recusam a resposta.

 1999

 

O processo é remetido para os meandros da administração autárquica.

Março/Abril. Estudo da autoria de Alexandra N. Alegre, João Appleton, Teresa V. Heitor, publicado na revista Urbanismo-Lisboa da CML concluía que era urgente uma intervenção da CML para travar a degradação da zona.

 

Novembro/Dezembro. O Boletim da Direcção Municipal de Planeamento e Gestão Urbanística publica um importante estudo dos arquitectos Ribeiro Teles e Fátima Leitão, sobre o Bairro de Alvalade, e em particular sobre a àrea da Rua José Lins do Rego. O estudo apresenta uma solução integrada para o estacionamento na área, que corresponde ao espírito das propostas que os moradores desde há muito vinham apresentando à CML.

2000

 Sem terem consultado os moradores os vereadores da CML Fontão de Carvalho e Machado Rodrigues, cedem à "Associação do Parque Residencial da Rua José Lins do Rego" terrenos camarários situados na rua José Lins do rego, para que esta possa aí construir um parque de estacionamento (Proposta 82/2000).

Desconhece-se a existência de estudos prévios que tenham fundamentado esta decisão camarária, assim como os critérios que terão presidido à escolha do local. 

 

2001

 Ano de eleições autárquicas.

26 de Abril. A CML ordena a revisão do Plano Director Municipal, discussão pública que terminará a 8 de Agosto. Neste Plano, elaborado ao longo de 3 anos e suportado em diversos de estudos, a praceta José Lins do Rego é considerada um sistema húmido. As construções subterrâneas nestes sistemas serão fortemente condicionadas ou mesmo interditas.  

 Manifestações generalizadas de indignação contra a construção do parque na praceta.

4 de Maio. Os presidentes da Junta de Freguesia do Campo Grande e da Associação Auto-Parque Lins do Rego, num documento assinado por ambos, informam alguns moradores que o parque de estacionamento era um "facto consumado". Todas as licenças  camarárias haviam sido emitidas. Neste documento convocam os moradores para uma "reunião de esclarecimento" a fim de os inteirarem do calendário e algumas questões técnicas das obras a efectuar

22 de Maio. Na "reunião de esclarecimento" que ocorre na Junta de Freguesia, presidida pelo presidente da Associação Auto-Parque Lins do Rego, é mais uma vez reiterada a ideia que tudo está decidido.

 23 de Junho. Após diversas reuniões é organizada uma comissão de moradores da RJLR.

Envio ao Presidente da CML de uma carta assinada pela comissão de moradores, onde se  expõe, uma vez mais, as razões pelas quais desde há anos, a maioria dos moradores praceta se opõe à construção do parque neste local. Solicitam uma reunião com carácter de urgência para analisarem o assunto. 

 14 de Julho(sábado) . Pelas 10h35 chegaram à Praceta dois "jipes" com três elementos da empresa contratada para a construção do parque.

Objectivo: iniciarem a instalação do estaleiro para o arranque das obras. As viaturas e as matriculas eram conhecidas dos moradores. Estes sabendo das intenções dos mesmos contactam com a CML. João Soares, intervêm pessoalmente no caso e garante que nada está decido sobre o parque, e nada será decidido nas costas dos moradores. Anuncia que irá nomear um grupo de trabalho para estudar o caso. Considera um autêntico disparate  parque na praceta.

27 de Junho. É afixado na praceta uma "licença" camarária sobre o parque. A confusão é total. João Soares continua a garantir aos moradores que o assunto está a ser resolvido.

4 de Julho. Os moradores solicitam à Junta de Freguesia do Campo Grande esclarecimentos sobre a Associação promotora do parque, bem assim como identificação de quem assumiria as responsabilidades por eventuais danos que a obra viesse a provocar na edificações. Na resposta, a 10 de Julho, a Junta é taxativa: desconhece todos os elementos que os moradores lhe solicitam. Afirma mesmo que não tem nada haver com o processo, embora a citada Associação tenha a sua sede na Junta.

9 de Julho. A comunicação social começa a fazer eco dos protestos dos moradores.

 11 de Julho. Envio de um abaixo-assinado ao Presidente da CML, João Soares, assinado por 210 moradores no qual estes se manifestam contra construção do parque na praceta. A recolha de assinaturas é feita em apenas 48 horas.

14/15 de Julho. Vários orgãos da comunicação social estão presentes na praceta para recolherem informação "in loco". Presenciam a forma como os serviços camarários exerceram uma verdadeira represália sobre os moradores, não limpando ou tampando os buracos na rua, ou ainda abandonando o jardim até que estes aceitem a referida construção do parque. A visita que alguns fazem aos espaços alternativos propostos pelos moradores, põe  nú, a ausência de uma visão abrangente para o problema do estacionamento na área.

18 de Julho. Reunião na CML entre os moradores, CML, Junta de Freguesia e Associação promotora do Parque, estabelecem-se alguns consensos: a) A esmagadora maioria de moradores está contra a localização do parque na praceta; b) os moradores não foram  consultados como determina a Deliberação 500/CM/94 e de forma sistemática ignorados os seus protestos; c) o parque não resolve os problemas de estacionamento no local, antes os agrava; d) a localização do parque contraria estudos encomendados e publicados pela CML, nomeadamente a proposta do novo Plano Director Municipal; e) a CML mostra-se disposta a encontrar alternativas para a localização do parque, proposta aceite pela citada Associação. 

20 de Julho. Distribuição de um Comunicado aos moradores da Rua José Lins do Rego, informando-os sobre o desenvolvimento do processo e os consensos obtidos.

20 de Agosto. A vereadora Alexandra Gonçalves (pelouro de Limpeza, Higiene Urbana e Saneamento), visita a Preceta, acompanhada de diversos dirigentes municipais, como o Eng. Camossa chefe da DMIL. Fica impressionada com o aspecto de gradação do jardim, após ter visitado os locais alternativos para a construção do famigerado parque, promete aos moradores que o parque não seria construído naquele local.  O jardim é limpo, assim como se procede a uma limpeza geral desta zona do Campo Grande. A Junta de Freguesia é pressionada para  arranjar as áreas ajardinadas que por contrato lhe haviam sido confiadas.

2 de Novembro. Colocação de pilaretes no jardim a fim de evitar que o mesmo fosse destruído pelo estacionamento caótico de automóveis, o que estava a ser incentivado pela CML.

26 de Novembro. A Chefe de Divisão da Zona Oriental da DMIL, recém nomeada para o cargo, garante que as promessas feitas aos moradores pelos dirigentes camarários, não passam de manobras eleitorais para captar votos entre os descontentes com a actuação da CML

17 de Dezembro. Eleições Autárquicas Na Freguesia do Campo Grande, o presidente Junta de Freguesia (Joaquim Rocha Cabral), que dispunha de uma confortável maioria absoluta sofre uma pesada derrota. Os leitores reprovam desta forma a incompetência e a mais completa falta de respeito pelos moradores. Santana Lopes, o candidato  que ganha as eleições para a CML  promete durante a campanha eleitoral que não seriam construídos mais parques de estacionamento subterrâneos em jardins. 

Actuação da CML:

 

Nos bastidores o processo não pára: a CML, em 2001, cede o espaço do jardim à Associação, aprova licenças, etc.

Os moradores são ignorados neste processo, apesar da lei exigir a sua consulta. 

 

Em fins de Junho de 2001, os moradores são confrontados com um facto dito consumado. O parque ia avançar contra tudo e contra todos, garantia a Junta e a Associação  promotora do Parque. 

 

Os moradores não desarmam e começam a descobrir zonas pouco claras no processo. Alertam para o secretismo que envolve os reais proprietários de um parque dito residencial. O seu nome e residência é mantido no mais absoluto dos segredos; a CML e a Junta afirmam publicamente desconhecerem a sua identidade, e que também não possuem mecanismos legais de controlo e fiscalização. 

 

É neste contexto que aumentam, entre os moradores, as suspeitas de que estavam perante mais um caso de especulação com terrenos públicos, com a conivência de funcionários e dirigentes públicos. Mais de 210 moradores assinam agora um abaixo-assinado, onde reiteram todos os motivos pelos quais, desde 1998, se manifestam contra a localização do parque. 

 

A CML, após uma reunião com todas as partes, no dia 18 de Julho de 2001, suspende por tempo indeterminado, todas as licenças. 

 

Em

declarações à agência Lusa e comunicação social comprometeu-se a:

 

1. Respeitar a vontade dos moradores que desde há cerca de cinco anos protestam contra a construção de um parque de estacionamento na Rua José Lins do Rego; 2. Estudar de forma planeada e apoiada em estudos técnicos devidamente credenciados, alternativas para a sua construção em terrenos baldios e lixeiras existentes na área.

 

O processo não terminou, nem era esperado, tantos são os interesses em jogo. Nos bastidores, Junta e Associação desdobram-se em contactos, mobilizam   influências, nada que não seja habitual nestes casos.

 

O mês de Julho e Agosto de 2001 é de enorme turbulência no bairro. É neste ambiente que surge o Jornal da Praceta, quando alguns moradores tomam consciência que tinham que criar os seus próprios meios de recolha e tratamento da informação, e desenvolver novas formas de intervenção cívica. Era o início de uma vasta rede de solidariedade, mas também de cumplicidades em prol de Lisboa. 

 

Os meses de Setembro a Novembro de 2001 foram de intensa boataria na praceta. A comunicação social passou a envolver o vereador Machado Rodrigues em alegados actos de corrupção. Os moradores da Rua José Lins do Rego continuam a acreditar no compromisso estabelecido com a CML. Esta deu sinais que alguma coisa havia mudado de posição face à questão do parque, assim a 2 de Novembro de 2001 mandou colocar pilaretes no jardim a fim de evitar que o mesmo se transformasse num parque de estacionamento.

 

As eleições autárquicas de 16 de Dezembro de 2001, acabaram por confirmar aquilo que era já previsível. Apesar de ter tido nas eleições anteriores uma confortável maioria absoluta, o Presidente da Junta de Freguesia do Campo Grande sofre nestas uma pesada derrota eleitoral. Desta forma os moradores quiseram demonstrar que estavam fartos de tanta incompetência e falta de respeito. Santana Lopes, o vencedor das eleições, garantira durante a campanha eleitoral que não faria mais parques subterrâneos em Lisboa, muito menos em jardins públicos.

 

    
Continua

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A Destruição do Jardim da Rua José Lins do Rêgo

 

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