1ª. Sessão de 2022: Como viver com a identidade? .

"Dia Estranho". Foi com esta afirmação que Gonçalo M. Tavares, no dia 24 de Fevereiro, pelas 18h30 deu início ao ciclo de conversas temáticas sobre a nossa sociedade a partir da literatura. Na madrugada deste dia a Ucrânia foi invadida pela Russia. Putin, o ditador russo, no discurso às tropas e ao mundo evocou o direito de defesa da "identidade dos russófonos". No seu entender onde houver falantes de russo há Rússia, isto é, território russo. Uma associação expansionista que Gonçalo M. Tavares descodificou. Um dos intervenientes no debate referiu a este respeito a obra de Francis Fukuyama - Identidades. Nela o autor chama à atenção para o processo de apropriação do conceito de Identidade por parte de lideres nacionalistas e populista para em nome da "Identidade" de "nações", "religiões", "culturas", "etnias" ou "géneros " procederem à exclusão de partes da população, perseguição e extermínio de minorias, impondo regimes tirânicos em nome da defesa da respectiva identidade.

O tema desta sessão era justamente "Como viver com a identidade?". Como pretexto um verso: “Eu, dejecto de estrela e desperdício de anjo” de Vitorino Nemésio datado de 1939, e o livro "Um, Ninguém e Cem Mil”, de Luigi Pirandello. A conversa espraiou-se depois pela multiplicidade de abordagens possiveis do conceito de Identidade. No fim, Gonçalo M. Tavares voltou ao princípio para deixar no ar a pergunta: "Como Parar Isto? ".

Poema Áspera Vida (Excerto) de Vitorino Nemésio

Intróito Áspera vida, Senda pobre, Deuses remotos, Homens perdidos. . Quanta energia Erma no sonho, E o casto vento amotinado E a chuva calma em terra aberta A nossa mente descoberta ! . Triste poema Da hora espera, Submissão e pronto no pensamento, Leva-me todo ao tempo intacto Que uma palavra pura atinge, E, já conexo em mente e alma, Dura no eterno retornar. Só tu comoves o alto enigma: Nós não sabemos decifrar. Ah! A saudade dessas milhas salgadas, sem corpo, E a névoa e extensão que elas mesmas criavam ! O desejo de ser o lado de lá de tudo isso, Muito mais do que horizonte - e ali sempre pregado ! Ali, orla de mim, termo de mim comigo! Ali, eu osso, e areia o resto, e longe o resto! Ali, eu sangue, posição e olhos compridos! O mar formado ali, no sal dos meus desejos, Rasgado pelas naus que eu fui, de mim fugindo, Pesando nos fundões que deixei, lá submerso: Eu, dejecto de estrela e desperdício de anjo, Coisa sem fim no pequenino, A esta hora talvez já mar, só de saudade; Talvez feito um bocado para onda, Só de o meu peito se lembrar de outrora, Um outrora que é água nos meus olhos - Não que nenhuma lágrima se prenda A estes meus verdadeiros cílios secos, Linhas da minha vida em meu olhar: Mas porque ele mesmo, o olhar, é um pouco de água Transtornada de humano sentimento, Prolongada no ver pelo pensar."

"Um, Ninguém e Cem Mil”, de Luigi Pirandello

2ª. Sessão: Como viver com a linguagem?, 24 de março

 “Não há montanhas se não há palavras.

Não foge a bala se não há espaço.”, Pedro Tamen

Livro recomendado: “Poemas completos”, Herberto Helder

Inscrições de 1 a 17 de março

3ª. Sessão: Como viver com a arte?, 28 de Abril

 “Palavra, um homem tem que ser prodigioso.”, Fernando Assis Pacheco

Livro recomendado: “Manual de pintura e caligrafia”, José Saramago

Inscrições de 1 a 21 de abril

4ª. Sessão: Como viver com as imagens?, 26 de maio

“Digo: eu sou a beleza, seu rosto e seu durar.”, Herberto Helder

Livro recomendado: “O Retrato de Dorian Gray”, Oscar Wilde.

Inscrições de 1 a 19 de maio

5ª. Sessão: Como viver com o poder?, 23 de Junho

“Assim basta o cinzento fato completo silencioso com lugar para os olhos”, António Franco Alexandre

Livro recomendado: “Mefisto”, Klaus Mann

Inscrições de 1 a 16 de junho

Gonçalo M. Tavares desde 2020 colabora com a Junta de Freguesia de Alvalade no projecto "Leituras Comentadas" cujos videos podem ser vistos no Youtube.

Inscrições através do email: biblioteca.chaves.caminha@jf-alvalade.pt. As sessões decorrem em formato online entre as 18H30 e as 20H00

Gonçalo M. Tavares:"Prémio Universidade de Lisboa"

O Prémio Universidade de Lisboa, na sua edição de 2019, acaba de ser atribuído ao escritor Gonçalo M. Tavares (15/10/2021). O juri considerou que a sua  obra literária era singular, impressiva no âmbito de tópicos e preocupações que versa, e objecto de um amplo reconhecimento internacional que excede o da quase totalidade de autores da sua geração em qualquer idioma. Traduzida em praticamente todas as línguas europeias, bem como em, por exemplo, chinês, japonês, árabe, hebraico, hindu, ou crioulo, a obra tem conhecido, e continuará decerto a conhecer, uma repercussão pública notável e crescente. Gonçalo M. Tavares é professor da Universidade Lisboa. Entre a sua já vasta obra destacamos: Jerusalém (2004), O Senhor Valery (2006) e Aprender a Rezar na Era da Técnica (2007).