Alvalade é Tranquilidade

"É hoje!". Foi com estas palavras que Gustavo Gouveia, o conhecido dinamizador do site "Vizinhos de Alvalade" abriu as portas do Forum Lisboa, onde a Assembleia Municipal de Lisboa iria discutir a Petição "Alvalade é Tranquilidade" que lançara em Março de 2022. A onda de assaltos que ocorreu nos últimos meses de 2021 e princípios de 2022 fez crescer na freguesia de Alvalade uma vivo sentimento de insegurança.

"Preparado?". A resposta foi breve e afirmativa: "Como não?! Há um ano que esperamos por esta discussão", Gustavo Gouveia na Assembleia Municipal de Lisboa.

A discussão na AML da Petição, Relatório e Recomendações, no dia 2 de Março de 2023, pelas 16h00, como se verá, permite-nos perceber como as diferentes forças politicas encaram o problema da segurança. Vamos a factos.

1. Razões dos Peticionários

Em fins de Março de 2022 um grupo de moradores resolveu promover uma petição para o reforço da segurança em Alvalade. A criminalidade que se registava na freguesia estava a criar um forte sentimento de insegurança na população ( consultar ).

O texto da petição referia uma onda de assaltos que tinha ocorrido nos últimos meses em artérias comerciais da freguesia como a Rua Augusto Palmeirim, Avenida da Igreja e a Avenida Rio de Janeiro. Os promotores referem também incidentes com funcionários do Centro Comercial de Alvalade provocados por grupos de marginais. Não faltavam "casos" de vandalismo, roubos, agressões ou tráfico de droga (em crescendo). A maioria destes "casos" não são reportados à PSP, a razão é conhecida. A Petição, subscrita por 433 peticionários à data da recepção era para ser discutida na Assembleia Municipal de Lisboa (AML) em Setembro.

O Jornal de Noticias, no dia 1/09/2022 entretanto publicou uma reportagem sobre a criminalidade em Alvalade. Os fregueses entrevistados descreveram cenas de roubos e assaltos. A Junta de Freguesia de Alvaldade quando foi ouvida sobre o assunto, faz o balanço sumário dos últimos dez meses: jovens assaltados com arma branca, três viaturas roubadas, dois estabelecimentos arrombados, roubo de catalizadores e limpa-pára-brisas. Uma contabilidade que revela o quanto anda alheada dos problemas da freguesia.

A reunião na AML onde seria discutida foi sendo adiada... e finalmente marcada o dia 28 de Fevereiro de 2023 !. Como não houve tempo para discutir a petição, relatório e votar as recomendações neste dia foi marcada uma nova data: 2 de março de 2023. Gustavo Gouveia, antigo membro da Assembleia de Freguesia do Campo Grande (2009-2013), subiu ao palanque pelas 16h05 para apresentar a petição. Numa cadência e num tom de voz adequado ao audtório disse:

"Senhora Presidente da Assembleia Municipal Senhores deputados da Assembleia Municipal e vereadores aqui presentes A todos os que me ouvem No passado dia 11 de Fevereiro (de 2022), foram reportados um conjunto de assalto que decorreram entre as 10 e as 11 da manhã na Avenida Rio de Janeiro, na Avenida da Igreja e na Rua Luís Augusto Palmeirim. O cenário repetia-se a 16 de fevereiro no Campo Grande e um pouco por todo o bairro de Alvalade. Esta triste realidade, indigna de uma metrópole cosmopolita moderna, não se esgotou então, e espelhou-se na destruição de dois carros a 10 de Junho na Avenida da Igreja, no roubo a uma pastelaria da Avenida Santa Joana da Princesa, de duas farmácias desta mesma rua onde nos encontramos, Avenida de Roma, ou no furto de uma mota, ontem, também em Alvalade.

No dia em que entreguei a petição, a 26 de Julho, foram subtraídas uma carrinha em frente ao Estádio 1º de Maio (de madrugada) e a viatura de uma Vizinha na Rua Marquesa da Lorna, célula 3. Na semana em que procurei apresentar esta peça aos excelsos deputados, deu-se o furto de uma viatura durante a noite – a 29 de Julho – junto ao INATEL – e aquando da reabertura dos trabalhos, em Setembro, uma outra na Avenida Frei Miguel Contreiras e novamente várias outras entre a Rua Epifânio Dias e a Rua Silva e Albuquerque (e ainda dois na Avenida de Roma) – onde vários carros foram vandalizados com o intuito de furtar bens no seu interior. A montante e a jusante é muito complicado definir limites para esta vaga de assaltos que culminou no caricatural episódio onde o assaltante, actuando pelas nove da noite na rua Acácio Paiva, foi filmado pelo carro de um vizinho e comerciante (senhor Francisco Ribeiro). Dá a sensação que de cada vez que me apronto a contactar a autarquia, uma nova vaga de assaltos ocorre e a sua proliferação demonstra que, caso a petição houvesse permanecido nas ruas, muitas mais assinaturas haveriam sido recolhidas. Esta onda de criminalidade deu já origem a várias peças jornalísticas a cujos autores agradecerei em seguida.

Com rendas de entre as mais altas da cidade, no coração de uma capital Europeia - ou nas palavras do insigne Alvaladense João Ribas, Capital da Capital - não seria de esperar escutar situações como as que cito, com assaltos em plena luz do dia, e uma população gradualmente temerosa pela sua segurança. A segurança, é, a primeira condição de estabilidade humana e é uma ideia transversal a todas as cores do espectro político. Por essa razão, os Vizinhos de Alvalade, mobilizaram-se e recolheram a petição que apresento dedicada a pedir às instituições, a esta instituição Assembleia Municipal, que lhes garanta mais segurança e passo a ler a petição. Colheu 168 assinaturas online e 302 nos estabelecimentos de comércio, cafés, lojas e farmácias, que nos quiseram apoiar Abro um parêntesis para Agradecer individualmente aos proprietários dos estabelecimentos: CHURRASCARIA RIVIERA, TAPAS DE ALVALADE, WONDER DOG, CROISSANT DA VILA, TALHO MAXIMIANO, DOCE AÇAFATE, GROGUE SANDWICH PUB, COMTRADIÇÕES, PASTELARIA FIT SALUDÊ – ASSALTADA – PETROMA, FADARIUS, PASTELARIA DÂMASO, FARMÁCIA ZIL, LEGENDARY BOOKS, DOIS DEDOS DE CONSERVA, MARA BOLOS, AQUATRO, RÁ SUPLEMENTOS, ALVALADE MOBILE, O ISCO, MARI GELATO, MENINA DO RIO, ADEGA VISEENCE – ASSALADA – FARMÁCIA MARBEL – ASSALTADA – FARMÁCIA ROMA – ASSALTADA – CBWEED, O PÃO E AS ROSAS, O SANTOS, FRUTALMEIDA – quais me ajudaram a divulgar a petição - provando que o Bairro partilha desta causa e qual solicitei cordialmente à Assembleia que considere. Agradeço também às jornalistas Sofia Cristino, do Jornal de Notícias, Arlinda Brandão, da Antena 1, Ana Meireles, do Diário de Notícias, Ana Luísa Alves da RTP, Diana Pinheiro da SIC, e ao mentor do jornal online “Jornal da Praceta” Carlos Fontes, que contribuíram para dar eco à nossa causa.

"Alvalade é Tranquilidade - Por uma freguesia mais segura !" Ministério da Administração Interna, Câmara Municipal de Lisboa, Junta de Freguesia de Alvalade, 18ª Esquadra da PSP de Lisboa (Campo Grande)

• Vêm os peticionários solicitar o reforço da segurança no coração do Bairro de Alvalade.

• Não obstante situarem-se na zona privilegiada da cidade, as nossas ruas foram recentemente alvo de um conjunto de assaltos inexplicáveis e inadmissíveis, decorridos em plena luz do dia.

• Assim, requer-se a mobilização de um agente policial permanente para a Praça de Alvalade e/ou que possa patrulhar a avenida da Igreja, Rua Luís Augusto Palmeirim, Avenida do Rio de Janeiro e respectivas transversais. Naturalmente, havido sida redigida por leigos, escapam uma serie de realidades, nomeadamente o facto de a competência de segurança não pertencer à polícia municipal, logo, não se encontrando ao cuidado dos órgãos autárquicos Mas os órgãos autárquicos, mormente a Câmara Municipal e a Junta de freguesia, podem reforçar o nosso apelo junto das esquadras e do MAI para que o apelo não caia no esquecimento. Podem ainda tomar medidas como:

• Garantir a iluminação nocturna das vias secundárias da freguesia onde alguns dos assaltos ocorreram

• Reforçar os meios materiais e humanos da esquadra

• Instalar – como foi proposto numa petição anterior – a videovigilância nos espaços da freguesia que não são habitados (como o jardim do campo grande ou a cidade Universitária), sabendo que dissuade o comportamento dos meliantes

• Acompanhar de perto as populações residentes auscultando as suas preocupações Devo mencionar que a nova comandante da 18ª esquadra se mostrou disponível para reunir com os signatários revelando que as forças policiais estão dispostas a colaborar prestando o seu melhor serviço para auxiliar as nossas preocupações. Agradecemos que as forças autárquicas aqui presentes façam o mesmo. Agradecendo à 8ª Comissão da Assembleia Municipal o obséquio de haver atentado nesta questão e redigido o relatório cuja minuciosa análise nos coube ressaltam duas questões quais vale a pena mencionar.

• Que o propalado reforço do efectivo policial da 18ª esquadra – na quantidade de 22 agentes – é imprecisa, pois não só esse destacamento corresponde a um destacamento temporário, logo, que é reduzido ao fim de seis meses, minorando pois o quadro efectivo da esquadra, como também que houve também agentes que abandonaram a esquadra levando a que o balanço de efectivos haja crescido menos do que o anunciado nas várias intervenções realizadas pelo presidente da junta

• Contam-se presentemente mais de 40 candeeiros de iluminação pública na freguesia sem funcionar. Áreas densamente populadas como a Rua José Duro não possuem iluminação nocturna há meses. Durante semanas, a rua das mimosas esteve às escuras. Estas, são condições impróprias para preservar a segurança pois sabe-se que a ocasião faz o ladrão e uma freguesia mal iluminada é convidativa a este tipo de práticas. Sabemos que a inacção reforça o sentimento geral da população que é de insegurança e que está plasmado nesta petição. Também sabemos que existe um diferencial entre a insegurança de facto, traduzida em número de denúncias, e o o sentimento de insegurança, mas os números citados para efeitos de comparação pela comissão, são de 2019, prévios ao COVID, e a utilização dos instrumentos societários como a denúncia policial ainda não retomou o ritmo corrente como deverá suceder agora. "

Lamento contrariar as declarações do excelentíssimo senhor presidente da Junta, como aquelas que entregou à comunicação social, mas não quero deixar de mencionar que esta proliferação de incidentes não pode ser descartada como uma coletânea de “furtos de ocasião” pois o sentimento generalizado de insegurança por parte da população deve ficar plasmado e que para isso sirva a minha deslocação à presente reunião. Nem desejamos que a presente acção se converta numa mera carta de intenções pronta a olvidar assim que os momentos de discussão pública terminem. Agradeço aos poderes municipais por permitir aos Vizinhos de Alvalade se fazerem ouvir."

2. Informação da PSP

No relatório apresentado na AML, o Comando da 2ª. Divisão Policial negava que tenha havido um aumento da criminalidade, apontando apenas para os dados de 2019 e de 2022. No primeiro ano foram registados 17 roubos e 2.517 denúncias. No último ano 9 roubos e 2012 denúncias. Depois destes factos, a 18º. Esquadra (Campo Grande), apesar da aparente diminuição da criminalidade na freguesia foi reforçada com mais 22 elementos, de 32 passaram para 54; o comandante da esquadra foi susbstituído e os meios existentes foram melhorados, e são hoje considerados os necessários. Os números disponibilizados pela PSP são o que são. É verdade também que nem sempre as vítimas de roubos, assaltos e outras ocorrências as reportam à polícia, pelas razões mais diversas.

3. Partidos Políticos

A discussão na AML permitiu-nos perceber com clareza as diferentes posições políticas dos partidos políticos que presentemente constituem esta assembleia. Antes desta discussão temia-se uma reacção negativa dos deputados a esta petição. Os anteriores peticionários foram censurados por exagerarem nos direitos da "Democracia participava" ( o poder dos cidadãos, por ex., os peticionários) face à "Democracia Representiva" (o poder exercido pelos deputados municipais). A recepção foi cordata.

O PS, apoiado na informação da PSP, desvalorizou a criminalidade em Alvalade, dissertando o deputado deste partido sobre a "Insegurança Efectiva" e o "Sentimento de Insegurança", citando estudos académicos sobre a matéria. Rematando o arrazoado com a afirmação que Lisboa era das cidades mais seguras do mundo.

O PSD, pela voz do actual presidente da Junta de Freguesia de Alvalade, baseada também na informação policial, afirmou qua a petição estava deslocada no tempo, deveria ter sido lançada em 2019 quando os números da criminalidade participada eram mais elevados. A grande aposta Junta era com os "guardas nocturnos" e "videovigilância". Como é seu hábito, procurou introduzir na discussão uma "nota cultural", mas perdeu-se ao tentar "filosofar" sobre a relação entre a "Liberdade" e a "Segurança", tendo daqui extraido uma bombástica conclusão: tudo está condicionado pela Lei. A Junta faz o que faz porque está condicionada pela lei, o mesmo acontece com a policia e por aí fora. Estas intervenções "filosofantes" mereciam ser reunidas numa antologia com a finalidade que já se advinha.

O PV e o PCP, pouco se distinguiram nas suas intervenções, remeteram a questão da segurança para o "policiamento de proximidade". Uma solução milagrosa para o problema. O PCP foi todavia mais longe, ao dizer que é mais fácil encontrar um "policia gratificado" à porta de um supermercado do que na rua. A título de exemplo referiu que a Esquadra de Carnide fechou para "abrir" no Centro Comercial Colombo. Outro problema é que a PSP não dá a informação que lhe é solicitada sobre a criminalidade na cidade e as esquadras. Em resumo: as conclusões que sobre esta matéria são retiradas, são sobretudo opinativas, meras impressões sensitivas ou ideológicas. Faltam números confiáveis.

O Livre procurou ligar a "sensação de segurança" à melhoria dos espaços públicos. Ficou-se apenas por dizer que havia uma relação, mas nada mais acrescentou. Lamentamos.

A IL avançou com uma tirada retumbante: "Sem segurança não há liberdade". A afirmação prometia... e infelizmente não teve sequência, o que não deixa de revelar alguma insconsistência ideológica dos liberais, no que não estão sozinhos na AML.

4. Recomendações

Foi elaborado um documento com algumas genéricas recomendações, a saber: melhorar a iluminação pública; instalar sistemas de videovigilância; "adequar os espaços públicos" (?) e reforçar o policiamento de proximidade (competência da PSP), o que na prática atira o problema para o governo. A polícia municipal fica de fora desta questão. As sintéticas recomendações foram todas aprovadas por unanimidade, com excepção da referente à videovigilância que recebeu os votos contra do Livre, Bloco de Esquerda, PCP, PEV e o PAN. A questão do assalto à privacidade dos cidadãos fundamentou esta rejeição.